A cada luar e nascer do sol, são
acumuladas cerca de 20 mil toneladas de lembranças. Tudo isso a cada 24 horas.
Dessas 20 mil toneladas, 15 mil voam junto com o vento. Das 10 que restam,
algumas também se perdem: 5 mil viram palavras. 3 mil viram beijos. 1 mil ficam
guardadas dentro da gente, mesmo quando a gente quer esquecer. E as outras mil,
guardamos por que não queremos perder. De jeito nenhum. Dessas mil que
guardamos, cerca de mais ou menos metade não podem ficar expostas no vão da
sala, pra todos os neurônios verem, imaginem os danos! Não ficam nem nas veias,
nem na mente e nem no coração. Elas ficam debaixo de um tapete – que é mágico –
De um tapete, ali mesmo no vão da sala. Bem no cantinho, à esquerda.
Completamente despercebido. Lá onde moram cerca de 500 quilos de segredos, que
queremos esconder até mesmo do próprio sofá (que recebe todas as queixas do
dia-a-dia) que tá aqui bem pertinho.
Debaixo desse tapete, existe pó
suficiente para causar horas e horas de alergia até ao coração mais protegido.
Imaginem o meu! Imaginem os danos! Por isso nem ouso fazer faxina debaixo desse
tapete.
Mas, eis que hoje, depois de todos
saírem da majestosa sala de desejos, tristezas e memórias, -que fica bem dentro
de não sei o que, mas, dentro da gente- um vento soprou e levantou uma pontinha
do tapete. Mas, não tinha ninguém por perto, ainda bem, porque, Imaginem os
danos! Fiquei com tanto medo do que tinha escapado de lá. Imagina só a alergia
sentimental que meu corpo enfrentaria num sábado trash feito este. Aí que veio a surpresa.
Não era poeira. Aquela lembrança que
tinha escapado não causou nenhuma espirradeira melancólica, nenhum soluço
magoado e nenhuma tosse cheia de fobias. Era colorido, e ficou suspenso bem no
meio da sala. E de repente, cerca de 200 kilos de lembranças maravilhosas em
forma de pó colorido suspenso no meio da minha sala, se transformou em
estrelas. Pequeninas estrelas, explodindo um céu estrelado bem no meio da sala
de teto fechado. E aí, eu vi que era você.
Que me abraçou mesmo estando suspensa no
ar em forma de céu e projetou nesse mesmo céu as melhores cenas do nosso filme.
E que cenas! Nesse exato momento, o meu corpo todo reagiu, não de forma
alérgica, mas, de uma forma, que...! Eu não sei. Só sei que logo logo todos vão
voltar, e você terá que voltar para o tapete, deixando assim o nosso filme em
volume único de edição. Sem nem uma chancezinha de ter uma segunda parte. Isso
não é uma saga, bem-zinho. Isso é volume único, pelo menos por enquanto. Isso
são 200 kilos de memórias feito pó –mas, feito pó de estrelas- que moram
debaixo do tapete.
Ora, vejam só que sorte a minha. De
possuir um céu debaixo de um tapete, na majestosa sala de desejos, tristezas e
memórias, -que fica bem dentro de não sei o que.
Então, meu desejo é que os deuses do
vento, te tirem de novo daí debaixo, pra quem sabe, uma dia sairmos da sala e
produzirmos assim, não só a segunda, mas, uma terceira e quarta versão desse
filme, que não mora mais em Roma.